Vera Barbosa

A maioria das coisas importantes que aprendo vêm de dentro, e não de fora de mim.

Textos

NOS PRIMÓRDIOS DA TELEFONIA

          Antes da parafernália eletrônica de comunicação, havia a carta, o telegrama e o telefone, cuja distribuição de linhas era a cargo de uma empresa estatal que, se não me engano, se chamava CTB - Companhia Telefônica Brasileira, que exercia o monopólio da telefonia no Brasil.
          Mas, até o início da década de 1970, telefone era para poucos, as linhas eram restritas e muito caras. A companhia fazia “Planos de expansão”, o cidadão pagava a linha em prestações mensais e ficava esperando a instalação, que poderia levar meses, dependendo do lugar. Quando não se tinha telefone o jeito era apelar para os orelhões ou para algum vizinho que dispusesse do precioso bem.
         Quando se comprava uma linha, adquiria-se o direito a algumas ações da companhia telefônica, que podiam ser vendidas depois de algum tempo. Havia muita demanda por linhas, as pessoas podiam negociá-las, algumas valiam mais do que outras – a infalível lei da oferta e procura já existia e, consequentemente, o mercado paralelo. Anunciava-se a compra ou venda da linha em jornais, em avisos colados em postes ou por meio de papeizinhos distribuídos nas ruas.
          Se nosso telefone ficasse sem linha, íamos à casa de algum vizinho que tivesse ou a um orelhão, ligávamos para a companhia telefônica e, de primeira, um ser humano, de carne osso e sentimentos como nós nos atendia, anotava o problema e marcava um prazo para sua solução.  Simples assim. E o problema era mesmo resolvido – no prazo prometido.
          Naquela época havia uma profissão que acho que nem existe mais, dentre outras como ascensorista, entregador de pão e leite, bedel etc.: a telefonista. Mas elas não eram como esses atendentes de telemarketing, programados para falar algumas frases, tudo igual, independentemente da empresa para a qual liguemos, e que nunca resolvem o problema.
          Não, nos primórdios do telefone as telefonistas atendiam o telefone principal da empresa e transferiam a ligação para o ramal desejado. Se este estivesse ocupado, ela tinha a gentileza de nos deixar escolher se esperaríamos um pouco ou se ligaríamos mais tarde. Não é mais civilizado? Além disso, elas faziam as ligações interurbanas, antes do advento do DDD e do DDI. Os interurbanos podiam ser feitos do telefone de casa ou de cabines públicas.
          Hoje o sistema de telefonia mudou radicalmente. Depois da privatização, em que entraram em jogo as Telefônicas estaduais, e depois as operadoras de celulares, falar ao telefone pode se transformar num verdadeiro inferno.
          Para começar, ele nunca funciona direito, e mesmo quando está funcionando, quase nunca conseguimos falar com pessoas, só com “vozes” gravadas, padronizadas: “se quer tal opção, tecle um, se quer outra tecle dois, etc., e as opções vão até oito, se quiser falar com um de nossos atendentes tecle nove...”, mas se você tecla nove fica ouvindo eternamente uma musiquinha irritante e dispensável, ou outra gravação que se repete, e repete, e repete, até que a linha caia – ou a pessoa, vítima de um ataque cardíaco causado pelo estresse. Se caímos na asneira de teclar logo algum número antes do nove, a gravação se repete, abrindo o leque novamente, e escolhemos outra tecla e novo leque se abre, num absurdo e labiríntico fractal. Aí nos perdemos, esquecemos até o que íamos falar, perdemos a memória de tanta ira, de sensação de tempo perdido e de ilusão de comunicação.
Primavera Azul
Enviado por Primavera Azul em 15/03/2012


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